A imagem do beijo de duas atletas russas no momento de receberem a medalha de ouro na estafeta de 400 metros dos Mundiais de Atletismo em Moscovo está a dar a volta ao mundo. Muitos viram nele apenas uma saudação mais afetuosa, mas já se tornou no maior protesto simbólico contra a legislação anti-homossexual aprovada por Putin.
Saudação afetuosa ou ação de protesto? Qualquer que seja a resposta, esta é a imagem que vai ficar na história dos Mundiais de Atletismo de Moscovo. Foto Reuters
A fotografia da Reuters, tirada no pódio onde se encontravam as quatro atletas vencedoras da prova, ficará na história desta competição. Duas das vencedoras, Kseniya Ryzhova e Tatyana Firova, beijaram-se na boca, e o que noutras circunstâncias seria visto como um gesto de celebração mais efusiva, tornou-se inevitavelmente um sinal de protesto contra a repressão que é cada vez mais visível, inclusive nesta competição, contra a comunidade gay e lésbica por parte do governo. Durante a semana, as declarações de outra atleta - Yelena Isinbayeva, embaixadora olímpica para a juventude - voltaram a abalar os participantes nos mundiais de atletismo, ao criticar os atletas que tomaram posição contra a lei discriminatória aprovada em junho e em defesa da tolerância e diversidade.
A lei promovida por Putin visa proibir a "propaganda homossexual dirigida à juventude" e está escrita de modo suficientemente vago para poder criminalizar com penas de prisão qualquer ato, informação ou opinião que possa entrar em conflito com os valores da "família tradicional russa". Ou seja, mesmo estas duas atletas, que no sábado eram heroínas nacionais com a melhor marca do ano na sua modalidade, correm o risco de ser presas por causa do beijo da vitória, que é expressamente proibido na lei.
Tal como os Mundiais de Atletismo que terminam este domingo em Moscovo, também os Jogos Olímpicos de Inverno do próximo ano na cidade russa de Sochi estão marcados pela polémica que opõe os valores do desporto e da não-discriminação à repressão cada vez maior sobre a comunidade LGBT na Rússia. Aparentemente, o Comité Olímpico Internacional tem recebido mensagens díspares de responsáveis russos sobre se a lei será ou não aplicada aos atletas.
Neste clima, começam a levantar-se vozes a favor do boicote aos Jogos Olímpicos de Inverno. O ator britânico Stephen Fry tomou a dianteira e já dirigiu esse pedido ao primeiro-ministro David Cameron. Para o ator, permitir a organização dos Jogos na Rússia de Putin só tem comparação na autorização para Hitler organizar os Jogos em 1936 na Alemanha nazi.
Também o tetracampeão olímpico de saltos para a água, Greg Louganis, deu voz ao protesto entregando na sede do Comité Olímpico Internacional, na Suíça, uma petição com 320 mil assinaturas a pedir a condenação das leis anti-homossexuais russas. O próprio Barack Obama foi forçado a intervir na polemica no início da semana, dizendo estar convencido que Putin e a Rússia "compreendem que para a maior parte dos países participantes nos Jogos Olímpicos não é tolerável que os gays e lésbicas sejam tratados de maneira diferente".