Hoje queria escrever mas não consigo escrever nada de jeito.
Como o mundo está, da maneira que chega em catadupa informação aberrante de todos os quadrantes, parece impossível não conseguir dizer nada. Não escrever nada de jeito. Nada que seja pelo menos uma revisão da matéria sobre a situação deste mundo actual.
Mas na verdade, cruza-se na minha mente o politicamente correcto de se dizer, com o politicamente incorrecto de se dizer. Essa dualidade anula-me a vontade.
Parece de quando em vez surgirem algumas ideias claras, um despertar para algo claro, transparente, minimamente racional, capaz de formar uma mensagem digna desse nome, que nem mereça da minha parte qualquer reparo ou contestação.
Mas logo se esvai uma tal clareza, uma tal racionalidade, esfumada na bruma da enxurrada da informação e contra-informação.
Somos assediados permanentemente com duas coisas: a realidade ela mesma, por um lado, a realidade escrita na nossa mente (herdada, fabricada, armazenada, encrostada) por outro.
E perante os desafios diários, permanentes, difíceis, contraditórios, em que ficamos?
É o que aquele diz que é correcto? é o que eu penso que é correcto? ou nada é correcto, tudo vale o que vale, nada mais, tudo não passará de um conjunto de conceitos a que damos nomes de conveniência para efeitos de arrumação mental?
Porque, seja aqui ou em outra parte da geografia, lá estão as pessoas, a vida, os usos e costumes, a imitação, os julgamentos, as escolhas, a paz, a guerra, o inevitável confronto, a miséria, a fartura, a organização, o deserto, o oásis, palavras e mais palavras, conceitos e mais conceitos, chavões e mais chavões.
Nomes, conceitos, saber, que se encaixam nos egos do mundo de acordo com as coordenadas dos sítios e dos tempos em que esses egos habitam.
Será tudo apenas para se atribuir um sentido à existência, nada mais?
Porém são essas palavras, esses conceitos, esses usos e costumes, essa imitação, esses chavões, essa miséria, essa fartura, esse deserto, esse oásis, que acentuam as diferenças que mal entendidas, mal aproveitadas, dividem a vida, separam as gentes.
Em vez de gerarem riqueza, diversidade, pluralidade, pelo contrário geram ódio, medo, vaidade, frustração, racismo, animosidade.
As palavras deveriam existir apenas para serem palavras, para que a humanidade se entendesse, para que fosse capaz de criar, de progredir, nada mais que isso.
Mas não.
Fiquem bem,
António Esperança Pereira
http://lusito.bubok.pt/
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