O FESTIVAL
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O FESTIVAL


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Fotografia de AC
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Na zona havia várias figuras diferentes, características, daquelas que são postal de qualquer lugar, sujeitas ao humor dos demais. Mas o Severino era caso único.
Antigo estudante em Coimbra, por onde deambulara vários anos, acabou por regressar à terra sem curso. Diziam uns, em voz baixa, que foram amores mal correspondidos. Outros, os mais antigos, rematavam a questão com deram-lhe por lá alguma coisa a beber, enquanto encolhiam os ombros em sinal de resignação. Fosse como fosse, a família colocara uma pedra sobre o assunto. E o drama do Severino, falado apenas à socapa, acabara por se desvanecer.
Os anos passaram. O Severino, herdeiro de terras e gados, foi gerindo as coisas ao seu ritmo. Falava com todos, sorria mesmo, mas apenas o indispensável. Não era bicho do mato, mas cultivava uma prudente distância, como que dizendo aos outros que cada um sabia da sua vida.
O Severino, sabedor privilegiado, através de antigos colegas, dos humores da política de subsídios dos burocratas europeus, tudo aproveitou, fosse abate ou implemento da vinha, do olival ou do que quer que fosse.
A vida não lhe corria mal. O dinheiro, embora pouco abundante, não faltava, dava emprego sazonal, percorria os campos como quem respirava. Mas sempre no mesmo registo: falava o indispensável, sem nunca se privar de sorrir.
As pessoas, a pouco e pouco, foram-se habituando àquela forma de estar. Continuavam a murmurar, estava-lhes no sangue, mas o tom era diferente.  A desconfiança, perante quem se detinha mais com as plantas do que com os homens, tornou-se respeito, do despeito adveio admiração. O Severino, contudo, pouco ou nada ligava.
Um dia a aldeia olhou-se, interrogada, para as máquinas que passavam em direcção a um dos campos do Severino. Da boca dele, nada. As opiniões dividiram-se, com algum calor à mistura, e mais se acentuaram quando, passado algum tempo, viram que, da paisagem dum velho olival, de troncos já bastante carcomidos, se vislumbrava agora um terreno liso, com três pequenos edifícios estrategicamente construídos, ladeados com uma ou outra árvore, de maior porte, poupadas, possivelmente, para sombra.
O falatório aumentou, os rumores eram mais que muitos, mas do Severino não se ouvia nada. Alguns, com maior proximidade, ainda ousaram perguntar-lhe o que era aquilo, mas ele apenas sorria. E só quando, uns meses depois, foram convocados para uma reunião no salão da Junta de Freguesia, é que ficaram a saber o que o Severino andara a tecer aquele tempo todo: a realização de um festival de música rock, com carácter anual, que traria à terra milhares de visitantes. 
Ainda mal a missa começara e já as bocas se abriam de espanto. O Severino, tal como os desconhecidos que o rodeavam na mesa, se queriam levar a deles avante, tinham muito que explicar. Mas ele, fiel ao seu registo, continuava a sorrir.
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