A BIBLIOTECA QUE (AINDA) SORRI
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A BIBLIOTECA QUE (AINDA) SORRI


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AC, Chuva em modo protegido
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Já chegou aos 90, mas a Ti Laurinda continua a gostar de gente, de corações a palpitar, de pessoas que gostam de ousar, de pousar, de (re)fazer, de rir. 
Os tempos mudaram muito, tanto que até parece outro mundo, mas ela não deixa que as suas memórias se apaguem. E, para os interessados, está sempre pronta para ensinar os rituais da confecção do pão e dos enchidos, como se secavam figos, como se cantava e dançava no seu tempo. Não lhe faltam histórias do outro mundo, temperadas de crenças, e até a receita de algumas mezinhas lhe continua a sair em voz pausada, mas sem hesitações. Quando o interlocutor vem com tempo gosta de falar da sua mocidade, das cantigas nos campos - às vezes, sabe, para enganar a fome - das desfolhadas, da apanha da azeitona, da boa vizinhança. 
- Veja lá que até dormíamos com a chave do lado de fora da porta!
Continua a gostar de viver, nota-se. Mas há algo que, de vez em quando, lhe turva o olhar. 
- Sabe, agora há estradas por todo o lado, boas casas, muita fartura de tudo. Nisso o mundo está muito melhor. Mas as pessoas estão diferentes, andam sempre a correr de um lado para o outro, já não dão importância à palavra dada. Têm muito, e ainda bem, que no meu tempo era uma desgraça pegada, mas nós éramos mais unidos, ajudavamo-nos uns aos outros. Agora cada um puxa para seu lado, olham de lado uns para os outros, desconfiado, queixam-se por tudo e por nada, qualquer coisinha as contraria. Porque será, mê senhor?
A chuva estival, ali mesmo à mão, serve-lhe de exemplo.
- Olhe, está a chover e toda a gente se queixa, por isto ou por aquilo. Mas as pessoas estão muito enganadas, já se esqueceram que quando chove, não chove.  É a vida a ser boa p´rá gente.
E a Ti Laurinda, matreira, sorri como quem pisca o olho...
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