Textos e Mensagens
BALADA PARA O SOPRAR DE NOVOS VENTOS
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Van Gogh, Paisagem da colheita
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A quinta, com o passar do tempo, fora ganhando uma ambiência muito própria. Durante o dia vivia-se a constância do movimento, moldada nos elementos. A natureza tudo nos dá, mas tudo nos exige, é uma cumplicidade sem concessões, e ali havia sempre algo para fazer. Contudo, chegado o ocaso, o vislumbre da lua apaziguava o instinto físico da sobrevivência. E, de forma natural, insinuava-se a poesia, cantando-se o já feito e as pontas daquilo que os desafiava. Semeava-se apaziguando, que a esperança carece de dificuldades domáveis. Era nessas alturas que Tiago se afoitava, que as suas palavras, preservando o que de bom tinham, os transportava para o que havia para lá do horizonte, recordando-lhes que não viviam sozinhos.
Um dia, num fim de tarde, Diana regressou. O seu olhar ainda guardava rastos de inquietude, mas estava diferente de quando partira. Havia nela um entusiasmo novo, próprio de quem encontrara algo e sentia necessidade de o partilhar.
Ao jantar, feito da frugalidade do que cultivavam, Diana começou-se a soltar. E falou com alma. Reforçou a ideia que já todos tinham – a impossibilidade dum mundo sob um jugo sem regras, que apenas beneficiava uma minoria sem rosto – e começou a lançar sementes dum diferente porvir. Reclamou da necessidade da visão feminina do mundo se chegar à frente, substituindo a secular e máscula prática guerreira, e que toda e qualquer solução, para ser sustentável, teria que se basear no equilíbrio com um elemento fundamental: a terra. E disse mais. Que, para lá da necessidade de as mulheres se chegarem à frente, era uma heresia ousar falar de liberdade quando não se respeita o mais elementar da nossa origem.
Tiago ouvia, deliciado. Não pela novidade, mas pela cumplicidade que sentia. Tudo aquilo, para ele, fazia sentido. Diana precisara de sair dali para entender, mas para ele a revelação viera com a percepção da elementar arquitectura da construção de qualquer ninho. Fosse ele de pintassilgo, de melro ou de rola. E, sem se dar conta, sorria enquanto ouvia.
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