RESPIRARES DA LUA NOVA - 1
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RESPIRARES DA LUA NOVA - 1


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Aldeia da Luz, Alentejo
Pegou na bilha de água turva, acenou aos guardas e rumou ao acampamento. Sentia-se suja, a carecer de um banho, mas as antigas rotinas eram agora um  luxo. Umas gotas no rosto, outro tanto nos sovacos, e já estava no limite. O líquido, em constante escassez, era demasiado precioso para gastos supérfluos. Até os legumes, cuidadosamente cultivados nos terrenos contíguos, dependiam do gota-a-gota em garrafas de plástico, engenho forjado no esgravatar do apelo da boca. Poupava-se água, ganhava-se esperança.
A nascente que lhes fornecia o precioso líquido era o grande bem do grupo, mas também o seu lado mais vulnerável. Atraía toda a espécie de pessoas, bonecos errantes em busca de sobrevivência. Uns tentavam integrar-se, sabedores que eram da importância de se ligarem a objectivos comuns, mas outros, autênticos predadores, apenas desejavam a sua posse. Ter aquela fonte significava poder, e alguns tudo faziam para a ter. Estava-lhes nos genes. Era por isso que a nascente estava tão bem guardada, era o núcleo essencial da preservação do grupo.
Ana, antes da grande hecatombe, gastava os seus dias a leccionar numa universidade da capital, mas há muito que o prazer do trabalho se esgotara na rotina bafienta dos seus pares. A vida escapara-se-lhes por entre os dedos das mãos, mas teimavam em fazer de conta que eram o centro das coisas. E ganharam mofo. Entre o sair e o ficar, aconteceu o colapso que muitos previam. E viera ali parar, nem sabia bem como, a um local onde tudo se fazia para que houvesse uma nova oportunidade. Era por isso que, apesar da escassez, nunca faltava a água no canteiro, com um variado leque de flores, situado mesmo no centro do acampamento. E, em certas noites, quando o breu da lua nova irrompia, o som do saxofone dum músico poeta ajudava a atenuar os receios. Todos por ali sabiam que, por vezes, o ânimo carecia mais de alimento que o estômago.
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