A PENHA
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A PENHA


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O sábado decorria, pachorrento, longe da agitação de mais uma semana de trabalho. Enquanto tomava café, chegavam até ele as conversas das mesas vizinhas, quase todas elas versando o mesmo: a malfadada crise.
Tentou alhear-se do rumor, não porque fosse indiferente ao que diziam, mas não gostava da forma. Todos se preocupavam com o seu quintal, com as suas mordomias, mas recusavam-se a ir mais além na compreensão do fenómeno. Perspectivas!
Saiu para a rua e encaminhou-se para o quiosque dos jornais. Os pensamentos insinuavam-se em catapulta, mas a pouco e pouco foi pondo ordem nas ideias.
- Olá, Henrique! Estás bom?
Absorto nos seus pensamentos, nem dera conta do Tiago, velho compincha de outros tempos.
- Olha o Tiago! Dá cá um abraço, homem!
O Tiago trabalhava em Lisboa numa multinacional, e vinha de quando em vez ao torrão natal matar saudades duma infância feliz. Não gostava do ritmo de vida da capital, demasiado desumanizado para quem tinha crescido em convívio de vizinhos.
- Amanhã, bem cedinho, vou até à Gardunha. Queres ir comigo?
Passados tantos anos, a serra continuava a ser a guardiã do faz de conta de menino, o recanto imaculado dos sonhos intactos guardados dentro de si. Lá no alto o Tiago sentia-se rejuvenescer, e sempre que vinha ao Fundão não dispensava uma ida à Gardunha.
O Henrique, outro incondicional da serra, só podia dar uma resposta.
- A que horas?
Perto das oito da manhã já o carro atravessava Alcongosta, estacionando minutos depois no largo fronteiro à Casa do Guarda. Depois de contemplarem, durante algum tempo, a policromia dos familiares campos da Cova da Beira, colocaram as mochilas a tiracolo e iniciaram a subida até às antenas, onde a vista alcançava mais longe. Chegados ao alto, percorreram o caminho desenhado no cume em conversa amena e despreocupada, longe das preocupações que os aguardavam lá em baixo. A certa altura, mesmo à sua frente, duas perdizes levantaram voo, incomodadas com aqueles dois seres palradores e sorridentes.
Um pouco mais à frente viraram à esquerda, em direcção à Penha. Quando chegaram à enorme massa granítica nem pararam para descansar. Ignoraram a pequena gruta, situada na base - onde, segundo a tradição, viveram frades eremitas - e instalaram-se no alto do penhasco.
A vista dali era fabulosa, com uma panorâmica de 360º. Viraram as costas à Estrela e concentraram-se na vertente sul, na direcção de Castelo Branco. Em baixo, quase ao alcance da mão, espraiava-se o casario de pedra da aldeia histórica de Castelo Novo. Um pouco mais além, para lá da Soalheira, o sol espelhava-se nas águas da Barragem da Marateca, conferindo à paisagem um toque mais aconchegante e harmonioso. Mais à esquerda, para leste, desenhava-se Monsanto, a nave de pedra de mil e uma histórias e lendas...
Durante algum tempo não falaram, absorvendo o espírito do local. Naquele recanto de lendas e encantamentos, conseguiam alhear-se das pequenezas da vida, dando dimensão aos pensamentos mais íntimos. Tiago, em esboço de deslumbramento, sentia-se a criança de outrora, como se estivesse no último reduto das investidas duma vida de concessões. A seu lado, em plena comunhão com o local, Henrique mergulhava num estado de quase levitação, amparado na cumplicidade duma Natureza sempre pródiga em revelações...
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