A Nebulosa (1959) impôs a Pasolini «vinte dias atrozes fechado num hotelzito a trabalhar como um cão». Guião literário escrito em 1959, irreconhecível no filme Milano nera (1961), e que se lê como um romance negro, apenas em 1995 foi resgatado ao esquecimento. Texto febril e colérico, A Nebulosa mergulha na periferia de uma Milão envolta em névoa, com «fieiras de luzes e de prédios envidraçados», onde um grupo de teddy boys, numa estonteante noite de fim de ano, afoga na mais extremada violência as suas frustrações. Nesta ronda frenética com contornos de Laranja Mecânica, em que só néons de bares pontuam a longa noite sem estrelas da juventude tentada pelo abismo, estão na mira de Pasolini a perversão moral engendrada pela sociedade afluente e o seu desprezo por tudo. A mesma perversão moral que, suspeita-se, terá selado o destino trágico de Pasolini.
Pier Paolo Pasolini (1922-1975) é um dos maiores intelectuais italianos do século XX. Cineasta consumado, a sua carreira reparte-se entre a escrita literária, o guionismo e o jornalismo. Nos anos 50, embrenhou-se no submundo de Roma, vindo a retirar dos pobres subúrbios proletários a matéria dos seus primeiros romances, Vadios (1955) e Uma Vida Violenta (1959), pelos quais dá corpo a corrosivas críticas sociais. Na década de 60, assinou o seu primeiro filme, Accattone (1961), somando desde então uma película por ano, entre as quais Mamma Roma (1962), Teorema (1968) e Decameron (1971). Nos anos 70, como periodista do Corriere della Sera, suscita controvérsia pelas suas ideias sobre o ateísmo, a homossexualidade e o fascismo. Acérrimo crítico da burguesia italiana em ascensão no pós-guerra e da sociedade consumista, revelou-se em todo o seu esplendor como figura maior que previu e denunciou os males da sociedade contemporânea. Foi assassinado em Ostia, nos arredores de Roma, em Novembro de 1975. |
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